sitemap VIII Encontro de Linguística de Corpus
 
 
 

A metáfora gramatical no ensino médio


Doris de Almeida Soares (PUC-Rio, PG)

Maria Cristina Góes Monteiro (PUC-Rio)

Violeta Quental (PUC-Rio)


A distância entre as modalidades oral e escrita na língua portuguesa é bastante evidente e vem se mantendo ao longo de séculos, sendo a escola um dos agentes de sua perpetuação. Esse distanciamento entre as variantes parece trazer dificuldades para muitos alunos no contexto escolar, não só com relação à aprendizagem da língua materna, mas também para o domínio de outras disciplinas de seu currículo. Isto porque, como a linguagem verbal é o sistema semiótico que utilizamos para falar de todos os outros sistemas de significados (Eggins, 2004), o seu domínio – ou a falta dele – pode determinar o sucesso ou fracasso na construção de conhecimentos em diferentes áreas do saber. Nesse sentido, o “bidialetalismo”  exigido na escola e a complexidade da escrita criam uma situação em que o aluno, por deficiências no uso da variante escrita, pode estar fadado a não construir conhecimento em nenhuma outra disciplina de seu currículo escolar. Considerando tal situação, este trabalho apresenta um estudo em andamento sobre um recurso fundamental para a elaboração de textos produzidos em contextos pedagógicos - a metáfora gramatical - que implica, dentre outros aspectos, a transformação de ideias mais concretas em mais abstratas, através do uso de nominalizações em lugar de processos verbais (Halliday, 1994; Heyvaert, 2003).

A nominalização, na perspectiva sistêmico-funcional, está estreitamente relacionada ao conceito de metáfora gramatical, já que constitui fonte recorrente para a criação de realizações léxico-gramaticais de categorias semânticas mais metafóricas do que típicas ou congruentes (Heyvaert, 2003:65). Supondo que parte dos problemas no uso da língua pode estar ligada à falta de domínio da metáfora gramatical (Christie, 2006; Oliveira, 2006), esta pesquisa terá como suporte teórico a Linguística Sistêmico-Funcional e a Linguística de Corpus (Biber et al, 1998; Sardinha, 2004), áreas que apresentam interrelações através da perspectiva sistêmica de linguagem, pois ambas pressupõem sistemas linguísticos paradigmáticos que apresentam probabilidades (Halliday, 1993:3), que podem ser apreendidas através das instanciações do sistema em textos e dos padrões que neles podem ser identificados.

Este estudo propõe, assim, uma análise dos traços lingüísticos que caracterizam as metáforas gramaticais e um cálculo de freqüências de uso de processos verbais e nominalizações (Simon-Vandenbergen et al, 2003; Biber, 1988) em, aproximadamente, 500 textos argumentativos produzidos por alunos de Ensino Médio em seis escolas previamente selecionadas, sendo duas da Rede Estadual, duas da Rede Federal e duas da Rede Particular de ensino da cidade do Rio de Janeiro. Com este estudo, almejamos, portanto,  delinear um panorama do uso das metáforas gramaticais por alunos do Ensino Médio e  refletir sobre as características da língua escrita. Acreditamos também que, a partir de dados mais consistentes, será possível sugerir metodologias baseadas em corpus que facilitem o ensino e a aprendizagem da leitura e da produção textual em língua materna em contextos educacionais diversos.

Para a testagem da metodologia, até o momento já foram analisados 24 textos argumentativos escritos por alunos do segundo ano do Ensino Médio em uma escola particular na zona sul do Rio de Janeiro. Os primeiros resultados mostram que, do total de 6.238 palavras desse corpus de teste, apenas 224 palavras (3,6%) são resultado de nominalização. No caso da opção pela nominalização, constata-se que o sufixo de maior frequência é o _ção, com 121 ocorrências no singular (54%) e 11 na forma plural _ções (5%), totalizando 59% dos itens mapeados. Outros sufixos também são utilizados, porém em número bem menos expressivo tais como _mento(s), que aparece 51 vezes (22,8 %); _ssão(ões), presentes em 24 ocorrências (10,7 %); _cia(s), em 10 exemplares (4,6%); e _dor(es), apenas 7 vezes (3,1%).  Esses números preliminares parecem indicar uma preferência dos escritores pelo uso de processos verbais, mais concretos e presentes com maior frequência na variante oral da língua do que o emprego de substantivos deverbais, que são típicos da escrita acadêmica.

Vista como indicador de maturidade de raciocínio, na medida que revela domínio de conceitos de caráter mais abstrato, a nominalização parece ser fenômeno lexical que dificulta a compreensão de textos científicos e que é pouco utilizada pelos jovens em sua atividade de escrita. Com o objetivo de verificar essas hipóteses, a análise das formas lexicais nominalizadas está sendo realizada, para verificar sua frequência relativa em corpus mais representativo. Estimamos que, em breve, teremos mais resultados para agregar aos dados preliminares aqui divulgados.

Espera-se, assim, com o desenvolvimento da presente  pesquisa, traçar um panorama do uso da metáfora gramatical por alunos de Ensino Médio e propor algumas formas de intervenção no currículo de língua materna, visto que apresentar evidências dessas hipóteses para o professor pode ter consequências benéficas para o ensino/aprendizagem em língua materna.


Palavras-chave: Linguística de Corpus; Linguística Sistêmico-funcional; Metáfora gramatical



 

Resumo